Introdução

O que segue não é propriamente um artigo, e sim um combinado de comentários sobre diferentes narrativas superficiais que inundaram as redes e que são frequentemente utilizadas para justificar a adesão aos criptoativos.

Nosso entendimento é que a grande maioria das narrativas é superficial, para não dizer leviana – mas todas elas exploram brilhantemente vieses cognitivos que nos levam a tomar decisões ruins.

Como participantes do mercado financeiro, nosso dever é zelar pelo seu bom funcionamento e pela preservação de sua integridade – o que resulta na preservação do patrimônio dos clientes também.

Na era do ESG, como consumidores somos responsáveis por tudo que encorajamos através de nosso consumo. Numa pirâmide, todo mundo é um pouco culpado pelo seu crescimento – e portanto um pouco culpado pelos prejuízos que inevitavelmente se materializam.

Se criptoativos são potencialmente uma pirâmide, nosso dever é alertar a todos para que façam minimamente sua própria diligência.

 

O pano de fundo desta discussão

Antes de mais nada, observemos o contexto em que estamos inseridos.

Vivemos a era do excesso e da descentralização da informação. A internet permite a criação de bolhas de conteúdo que se auto-validam pela sua própria velocidade de crescimento e adesão – e que são muitas vezes turbinadas por robôs e perfis falsos.

A PNL e as técnicas de marketing são aplicadas com a maior eficácia da história, surfando a era do big data que permite conduzir experimentos sociais em tempo real com a humanidade e extrair disto todos os ajustes finos necessários para hackear os cérebros do consumidor desatento.

Basta a correta campanha de marketing e a correta coordenação de mídias sociais para plantar a semente da dúvida e fazer germinar uma narrativa que se retroalimenta do engajamento e comoção que ela própria gera. E qualquer um faz isto, do sofá da sua casa, e transmite para as restantes 8 bilhões de pessoas do planeta – com um clique.

As verdades ficam cada vez mais borradas na incessante guerra de narrativas, e as pessoas não sabem mais em que acreditar. Tudo é teoricamente possível

A terra plana, a fraude na eleição (com e sem urna eletrônica), o remédio sem eficácia que tem eficácia, etc…

A velocidade da mudança também torna tudo menos nítido – é como viajar num carro a 120km/h e tentar distinguir a vegetação mais próxima olhando para o lado. A máquina que é nosso corpo simplesmente não foi projetada para isso, e é incapaz sequer de assimilar a informação em forma de imagens claras – que dirá processá-la. E quanto mais tecnologia surge, mais aceleramos na estrada, e menos conseguimos acompanhar.

Ilustremos com um exemplo apenas: há 20 anos atrás, aprendia eu nas aulas de história e geografia que dumping era o ato de vender produtos abaixo de seu custo de produção, com o objetivo de tirar seus concorrentes do mercado, sendo portanto prática ilegal e imoral.

Hoje, as grandes techs e startups geram prejuízo e queimam caixa recorrentemente durante anos, primeiramente tirando os pequenos players de circulação na busca pelo domínio total do mercado, e chamamos isso de nomes bonitos como venture capital e investimento-anjo.

Há 20 anos atrás, seria preso pela prática. Hoje, sairia na capa da Exame como o mais novo disruptor do pedaço.

Por fim, os formadores de opinião não são mais validados pela complexidade e relevância de suas obras, pela densidade de seu conhecimento, por revisão de seus pares ou pela coerência de décadas dedicadas a uma carreira – são validados pela quantidade de seguidores que angariam, e posteriormente validados pelo próprio sistema capitalista que utiliza da sua visibilidade e alcance para vender seus produtos e serviços.

As linhas que separam o certo do errado estão todas menos nítidas. E é neste terreno fértil onde floresceram as criptomoedas.

 

E agora sobre as criptomoedas

(ou como carinhosamente as chamo, vento enlatado digital)

Deveria ser tão simples quanto nos perguntarmos:

– É possível toda a humanidade ficar rica sem fazer nada, de uma hora pra outra, só porque comprou vento enlatado digital?

 

Deveria ser simples… mas não é.

O ônus da prova se inverteu e agora é necessário que quem não acredita nas criptomoedas prove que elas não prestam, e não o contrário!

É como discutir com o terraplanista que te pede para provar que a terra não é plana.

O resultado: um texto deste tamanho. Quando deveria ser simples.

 

Porque a maior pirâmide da história?

Basta olhar alguns anos atrás para o número de CPFs estimado negociando criptomoedas: cerca de 2x ou 3x o número de CPFs registrado na nossa bolsa de valores.

A bolsa de valores existe há 60 anos. Bitcoin existe há 10 anos, tendo virado mainstream apenas em 2017 com a primeira subida meteórica.

Em 1-2 anos, havia mais pessoas negociando vento enlatado digital pela promessa de ganho fácil do que empresas reais.

 

Bitcoin é o primeiro ativo da história da humanidade que é negociado sob o mesmo código em qualquer local do mundo com facilidade.

Imaginem por um momento: o cidadão mediano não compra ações americanas com facilidade, não compra imóveis na França com facilidade… mas com alguns poucos cliques, compra a mesma criptomoeda aqui no Brasil que um japonês está comprando do outro lado do mundo.

São 8 bilhões de potenciais compradores.

E essa é a maior perversidade da coisa: o preço pode continuar rumo à estratosfera com toda essa demanda potencial.

Pirâmides normalmente desmoronam quando o ritmo de saída de dinheiro supera o ritmo de entrada. Nunca vimos uma pirâmide que tivesse este alcance todo, e toda essa “validação”…

Importante:

Numa pirâmide, não há “rendimento”. Existe apenas “dinheiro dos outros”.

 

Sobre a maneira como é negociado

É difícil levar criptomoedas a sério quando 100% das pessoas que querem comprá-la estão interessadas no ganho rápido e estratosférico. E quando o interesse só surge após altas espetaculosas.

Estou para conhecer alguém que compra bitcoins porque quer de fato ter um bitcoin.

Aliás, o que significa ter um bitcoin?

 

Sobre o valor como moeda

É curioso que se pregue o uso das criptomoedas para evitar os perversos bancos centrais e todo aquele blablabla, mas se avalie o valor da criptomoeda em dólares.

É um contrasenso em si mesmo.

O dia que um sanduiche custar 0,1 bitvento, ou uma diária de hotel custar 3 bitventos, aí talvez eu pare para entreter a ideia do criptodinheiro.

Até lá, se alguém se sente mais rico porque seu bitcoin agora vale mais dólares… bem, é o valor do dólar que continua importando.

 

Sobre o conflito de interesse de quem já está no jogo – incluindo os reguladores

Essa é talvez uma das partes mais interessante desse argumento todo.

Se você comprou bitcoin, só lhe resta promover e acreditar na utilidade dele.

E quanto mais gente compra, menos gente sobra pra criticar.

Pirâmide feelings, alguém?

Agora transportemos essa discussão para o regulador. Se as pessoas físicas que trabalham nos órgãos reguladores estiverem comprando bitcoin, qual interesse elas têm em fazer críticas ao criptovento? Em regular, limitar, alertar sobre?

Estão todos no mesmo barco.

É brilhante, não é?

Se você suspeitasse que colocou dinheiro pesado numa pirâmide, você:

– Sairia alertando todos aos quatro ventos, correndo risco da coisa implodir e você ficar sem seu capital?

– Sairia de fininho primeiro com o que desse para depois fazer barulho?

– Ficaria quieto esperando e rezando para seu dinheiro voltar, enquanto mais gente que entra certamente se estrepará?

 

Sobre o conflito de interesse do mercado financeiro

Muita gente acha que o mercado financeiro é esse ambiente bonito, de belos prédios e marcas, profissionais sérios de terno e etc.

Na realidade, o mercado financeiro não tem alma, cor, credo, e nenhuma outra qualidade que julgamos agradável ou positiva.

E isto não é bom nem ruim.

O mercado financeiro é um grande intermediário de recursos, e ganha dinheiro nas taxas de intermediação. É tão simples quanto isso.

Isto significa que se houver compradores e vendedores suficientes para qualquer ativo, o mercado financeiro é um feliz provedor da plataforma para facilitar a troca de mãos entre ativo e dinheiro.

Eis que entram em cena os criptoventos e seus 8 bilhões de potenciais compradores e vendedores.

 

Alguém vai querer perder essa boquinha?

Não sendo estritamente proibido, ilegal ou imoral, o mercado financeiro embarca na onda junto.

E as taxas pra se negociar criptoativos são uma obscenidade a parte….

 

Sobre o conflito inerente de se determinar a própria legalidade ou moralidade dos criptoativos

Ora, por tudo que comentei anteriormente, há embutido em toda a discussão da criptomoeda o interesse de ao menos caracterizá-la como uma zona cinza.

Não é dinheiro regulado, mas tampouco é pirâmide – já é suficiente para dar carta branca a todo o mercado para criar um negócio e receitas ao redor disso.

Levantar a dúvida é tudo que basta para que o sistema siga operando.

Pirâmide feelings, alguém?

Qual pirâmide, antes de sua implosão, não expediu comunicados dizendo que tudo que fazia estava estritamente dentro da lei e etc, e que desafiava alguém a provar o contrário?

 

Sobre a pseudo-validação que o mercado financeiro e a mídia conferem

O mercado financeiro não é só bom em intermediar negócios – ele também é incrível quando o assunto é fazer espuma e engrandecer as coisas.

Não basta termos as criptomoedas, na esteira delas vêm os analistas gráficos de criptovento, o research especializado, as projeções futuras, os macroeconomistas de criptomoedas.

Raios, vivi para ver até economista-chefe de criptomoedas. É mole?

E a mídia – bom a mídia vive de criar notícia. E ao fazê-lo e meter bitcoin em tudo quanto é manchete, falando de rendimento e etc, também contribui para criar este “ambiente de validação”.

Afinal de contas, algo que saiu no jornal ou na TV é mais confiável que algo de que nunca ouvimos falar, certo?

Que o digam as vítimas da pirâmide que chegou a patrocinar até camisa de futebol de clube carioca da primeira divisão…

 

Um parêntese:

Vejam, nem mercado financeiro nem mídia são “culpados” de nada. Não estou aqui apontando dedos.

Pelo contrário, ambas instituições têm papel fundamental no nosso dia a dia, mas trazem consigo tanto pontos positivos quanto negativos.

É importante apenas darmos este passo atrás para entender a natureza desses entes e do seu funcionamento, para então saber o que queremos absorver de tudo que eles têm a oferecer.

 

Rende tanto que dá até medo de falar que é pirâmide

Esta é outra peculiaridade que contribui na perpetuação da zona cinza: quem em sã consciência quer levantar a mão e falar que algo é pirâmide pro cliente que quer colocar dinheiro lá, correndo o risco de daqui 1 mês a coisa ter triplicado de valor?

Na dúvida sobre nossas próprias dúvidas, melhor responder naquela tradicional sabonetada de “talvez seja pirâmide, talvez não seja, pelo menos não coloque muito dinheiro se for comprar”.

E segue o jogo.

 

Sobre a maneira como nosso cérebro funciona

Vamos supor que é possível ganhar 10% ao ano sem risco.

Se eu te oferecer algo com mais risco que poderia render 15%, você talvez aceite o risco de render apenas 5% caso as coisas deem errado, mas jamais aceitaria o risco perder 5%. Não faz sentido abrir mão de 10% certos para ganhar algo entre 15% e -5%, certo?

Se te oferecer algo que pode render 30%, você talvez tope correr o risco de perder 10% para atingir esse resultado (20% de desvio para cima ou para baixo), mas jamais toparia o risco de perder 30%.

Mas e se eu te oferecer algo que pode render 100%? E 200%? 500%? 1000%?

Quanto você topa perder agora?

Perceba o seguinte: o cérebro trabalha dentro de uma razão de retorno e risco razoável quando os números são pequenos. E você sempre ajusta o risco que topa de acordo com o retorno que espera.

Quando extrapolamos retorno ao infinito, você passa a aceitar absolutamente qualquer risco como razoável!

Eis o perverso golpe de mestre: Até o risco de estar se metendo numa pirâmide!

Se algo pode subir 200%, vale o risco de perder tudo. Se pode subir 500%, vale o risco até de estarem te dando um golpe.

“Vai que dá certo” – não é verdade? 500% é muita coisa!

Ou melhor ainda “Vai que estou errado e não é golpe, vou deixar de ganhar 500%”!

Hackearam seu cérebro, e você não percebeu.

Fizeram até a pirâmide se encaixar na tua análise de risco retorno, como se fosse qualquer outro ativo cotidiano.

Porque você acha que os rendimentos prometidos são sempre estratosféricos, ao invés de serem mais “realistas”, menos fáceis de denunciar como pirâmide?

Não só isso, mas retorno potencialmente infinito te faz achar razoável pagar absurdos de taxas para negociar esses pseudo-ativos. Se pode subir 500%, o que são 1%, 3%, 5% de custo transacional?

E a parte cientificamente mais inquietante: tudo isso vale para a pessoa que não tem conhecimento nenhum de finanças, e para o sujeito que ganha R$ 100.000,00 por mês.

O cérebro é o cérebro, independente do cargo que você ocupa ou da faculdade que fez.

Ou você nunca se pegou perdendo tempo de cogitar a validade de algo que promete ganhos tão absurdos – seja bitcoin ou qualquer outra meleca?

Nunca teve sequer alguns segundos de dúvida, “será que estou perdendo uma oportunidade?”

Nós na RN somos a prova viva, atendendo e observando clientes de todos os perfis ao longo dos últimos 8 anos. E somos prova viva também por sofrermos de tudo descrito aí acima. 

Afinal de contas, feliz ou infelizmente, também temos um cérebro (rs)…

Uma pirâmide não usual – ou uma bolha?

Tradicionalmente, uma pirâmide tem um operador que promete retornos, é responsável pela “empresa”, e um belo dia some com o dinheiro.

Bitcoin é descentralizado, não funciona assim. Não há uma mente maligna esperando o momento de sair correndo com seu dinheiro.

Talvez até exista, na forma da parcela dos bitcoins que jamais foram movimentados, e estão lá só esperando o momento ideal.

Mas a ausência de dono identificável não implica que a ferramenta é usada para o bem.

Seria bolha se os preços subissem descontroladamente e ganhassem vida própria além dos fundamentos.

Como sequer há fundamentos para analisar, e há um sem número de interessados em ver a coisa continuar inflando, eu entendo mais como pirâmide.

A primeira pirâmide descentralizada da história. A pirâmide de todos nós.

Nela, todos são potencialmente um pouquinho golpistas e um pouquinho vítimas.

Este é precisamente um dos aspectos fascinantes sobre toda esta onda, o grande experimento social que está sendo conduzido há anos acerca de como as pessoas se relacionam com essa tecnologia que poucos compreendem.

Alguns embarcam na promessa da riqueza fácil, outros aderem desconfiados com medo de perder o foguete pra lua, outros tratam como oportunidade de lucrar em cima do próximo, etc etc etc.

Quão errado poderia ser algo a que aderem milhões de pessoas? E ter milhões de adesões torna algo errado menos errado?

Mais uma vez, fascinante.

 

Sobre a adoção pelo Elon Musk e outros gurus da tecnologia

Há que se lembrar: estes caras estão interessados na inovação, e o mundo para eles é um playground. E isto é ótimo pra todos nós no big picture, evoluímos graças a eles.

Mas para eles, o que são pequenos solavancos no caminho da inovação, no nosso nível dos reles mortais são pessoas colocando todas suas economias em promessas fáceis e vazias, e tendo que conviver com as consequências depois.

O compromisso deles é com a inovação, e que continue assim. Nosso compromisso é outro, e há espaço para ambas as atuações na sociedade sem que nenhum dos dois esteja necessariamente certo ou errado na sua totalidade.

Sobre a adoção por empresas

Se bitcoin ou qualquer outra criptomoeda vier a ter valor algum dia, as empresas se converterão à nova moeda. Tal qual uma empresa na Venezuela hoje deve funcionar com dólares, não mais com o papel-moeda-higiênico de outrora.

Receberão em bitcoin, venderão em bitcoin, pagarão dividendos em bitcoin.

Prefiro continuar investido em boas empresas que geram valor para a sociedade.

A moeda de troca que elas utilizarão é consequência da evolução. E é mais fácil entender quais empresas geram valor do que adivinhar se algum criptovento vai de fato virar algo sério.

Ainda, vale ressaltar o absurdo que é termos empresas que derivam mais resultado financeiro da valorização de criptoativos do que de sua atividade-fim.

Há um ENORME conflito de interesses no fato destas empresas fazerem marketing ativo acerca de criptomoedas sendo que são diretamente beneficiadas pela alta dos ativos. É a manipulação de mercado descaradamente legalizada.

Sobre o medo da inflação – ou o estoque finito de bitcoins

Muito se fala sobre bitcoin ser uma moeda não inflacionária.

Primeiramente é genial que, para se prevenir do medo de uma inflação de 10% NO ANO, a alternativa sugerida seja colocar dinheiro num ativo que pode cair 30% NUM SÓ DIA. Qual sentido isso faz?

Inflação não é algo ruim nem bom, é apenas um fenômeno relacionado a dinheiro que precisa ser compreendido.

Coleções de latas, carros antigos, a escultura de massinha que fiz em casa ou um quadro do Picasso também são não inflacionários – não se cria mais de nenhum deles. Eu prometo que minha escultura vai valer milhões no futuro, há interessados? Vendo ela até em forma de NFT…

 

Sobre descorrelação com outros ativos

Outra das asneiras que se repete para aumentar a validação das criptomoedas – seu preço não oscila junto de outros ativos, portanto é ótimo para compor portfólios equilibrados.

Ótima tentativa. Ao invés do tradicional e alegre “vamos todos ficar ricaços no bitcoin galera”, existe a linha mais sóbria do “Este pode ser um bom ativo para compor até 5% das carteiras” dita pelo cidadão de terno que fala difícil e passa seriedade .

É ponderado, é mais profissional, passa até mais credibilidade porque se preocupa com o risco, não é verdade? Apenas 5% da carteira parece razoável…

Imagine 5% de todas as carteiras do mundo comprando bitcoin…

Do meu lado, eu andei observando o preço do morango recentemente, e ele também é bastante descorrelacionado dos ativos tradicionais. Metade das vezes em que a bolsa cai, o preço do morango sobe.

Passarei a sugerir 5% dos portfólios alocado em morango.

 

Sobre a mineração da criptomoeda

Esta realmente me deixa embasbacado. Se o intuito é ter um dinheiro finito, e o valor desse dinheiro será determinado pelos interessados em comprá-lo, porque raios é necessário minerar a bendita moeda?

Por que não se distribuem todas as unidades da moeda por sorteio para interessados, e daí em diante cada um negocia no preço que quiser. O mercado vai atingir seu equilíbrio tal qual funciona hoje, e vida que segue. Temos uma nova moeda.

Se prestar pra algo, mais pessoas comprarão com o passar do tempo e o preço subirá – e vice-versa.

Sabe o que me lembra isso? A suposta complexidade que existe para justificar toda pirâmide.

“Fazemos trades de alta frequência com seu dinheiro para gerar o rendimento”

“Nossos algoritmos de arbitragem negociam bitcoin ao redor do mundo”

Vide também os golpes de empresas de marketing multinível. Quanto mais complexo, mais difícil de entender e mais legítimo parece.

 

Sobre o medo do apocalipse

O governo está imprimindo dinheiro infinito, todos estão muito endividados, não dá pra confiar em mais nada, o sistema vai implodir, as moedas atuais perderão todo seu valor e só sobrarão as criptomoedas que não são controladas por governos!

Se este é o medo, a solução definitivamente não é comprar bitcoin. É comprar terra, e plantar seu tomate lá pra poder subsistir.

Também será necessário comprar armas pra defender sua terra. Porque se chegamos neste ponto, bem… aí o buraco é mais embaixo.

 

Sobre senhas perdidas e o arcabouço regulatório

Eu perco 1 óculos por ano em média. Depois de férias e 1 mês sem acessar internet, muitas vezes não lembro mais minhas senhas. Já tive e-mail hackeado algumas vezes.

Se dependesse do bitcoin como armazém de riqueza, estaria condenado a viver como indigente o resto da vida. Guardar chave física? Ter certeza que lembro de passwords? E-mail 100% seguro? Celular a prova de roubo?

Difícil também vislumbrar moeda 100% desregulada e descentralizada. Hoje te roubam a senha, você tem o banco (e a polícia) pra ligar e te ajudar. Banco não resolve, tem o Banco Central pra acionar. Não resolve, tem a justiça. E etc. São várias camadas, que nos fornecem alguma proteção (mas também tem seu custo e burocracia).

E se roubam a senha da corretora de criptomoeda, pra quem você liga?

Sobre qual é o valor do dólar, se nem o dólar tem lastro mais

Essa bifurcação da discussão é ótima, mas merece um texto próprio. O lastro de todo o sistema financeiro mundial realmente hoje é algo pra deixar qualquer um de cabelo em pé.

É o famoso “melhor viver na ignorância”, tamanha a maluquice do que vivemos.

Mas de maneira alguma toda a zorra promovida pelos bancos centrais justifica querer usar dinheirinho de banco imobiliário pra pagar o supermercado.

 

O fim

Por fim, o fim.

Não há conclusão nenhuma para tudo que escrevi, é apenas um catado de considerações acerca de tudo que venho ouvindo há anos acerca de criptomoedas.

Somos ávidos observadores de questões referentes ao comportamento do investidor, e tudo que vemos referente a criptoativos não nos agrada nem um pouco.

Espero que algumas destas considerações ajudem no processo de reflexão de cada um.

Não pretendo estar certo nem errado, mas seria omisso se não me manifestasse – já o faço individualmente com clientes há anos, e há tempos ensaio escrever tudo que me ocorre quando penso no assunto.

Não pretendo ser um especialista no assunto tampouco, assim como não pretendo ser um especialista em argumentos anti-terraplanistas. Sou entusiasta da tecnologia do blockchain, da tokenização, e das mudanças que elas podem trazer.

Infelizmente, pirâmides são um problema inerente à humanidade e à ganância do ser humano. Não há fartura de informação que vá superar nossos instintos mais básicos ao que tudo indica.

A mim, na função que desempenho hoje, cabe o chapéu de zelar pelo bom funcionamento do mercado e repetir o alerta: numa pirâmide, não há rentabilidade. Há apenas dinheiro do outro.

Fica a critério de cada um determinar se quer correr o risco (para o bem e para o mal) de participar desse mercado. O status de zona cinza já foi conquistado e conviveremos com o vento enlatado digital por mais muito tempo.

Há uma verdade que permanece verdade nisto tudo: não existe dinheiro fácil.

Deveria ser simples assim… mas não é.

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